quinta-feira, 10 de maio de 2012

[Ano II, No. 16 - 2012] POESIA E ARTE ITALIANA, 1

Segui il tuo corso, e lascia dir le genti.
Segue teu caminho e deixa as pessoas falarem. - Dante

DAS CONCEPÇÕES MÍTICO-MATERIALISTAS, 1.
                                                                     Por Nina Rizzi

Um simples olhar a um quadro é bastante para nos dar alguma impressão a seu respeito. Com frequência, é muito mais difícil explicar exatamente porque formamos a impressão que temos ou como o artista logrou produzir seus efeitos. Mesmo que nos demoremos longamente na contemplação de um quadro, não é fácil encontrar palavras para descrever o que estamos vendo ou descobrir conceitos que auxiliem a compreensão.

É últil, por vezes, tentar olhar um quadro em termos de formas e cores, configurações, dimensões e arranjo dos motivos - tentando momentaneamente ignora-lhe o tema.

Assim que começamos a notar como uma figura é grande ou pequena em relação à moldura de um quadro e a observar se as pinceladas que a compõem são meticulosamente controladas ou aparentemente leves e soltas, podemos então começar a entender como um pintor é capaz de criar o efeito de magnificência dominadora ou de sugerir a impressão de elegância displicente.

Rafael (Rafaello Sanzio; italiano, 1483-1520), Galatéia, ca. 1514. Afresco, 295 x 225 cm. Vila Farnesiana, Roma. Clique na imagem pra seguir com Sonata in C maior, 1º movimento: adágio, de Baldassare Galuppi, interpretada por Arturo Benedetti Michelangelo.

Uma única figura apresenta menos problema a um pintor que um grupo. Aqui, Rafael teve de considerar problemas de construção/ organização para decorar a parede de uma residência particular em Roma com um afresco que mostra a Ninfa Galatéia montada num carro de conchas puxado por golfinhos e outras divindades pagãs secundárias; tinha de pensar no modo convincente, e, ao mesmo tempo, fazer um quadro equilibrado e harmonioso. Rafael quis assegurar-se de que o interesse se concentrasse em sua figura central, e o conseguiu - embora de modo diferente.

Galatéia não está colocada no alto da pintura nem claramente isolada dos dois grupos entrelaçados de três figuras cada, a um lado e outro dela; e, no entanto, Galatéia é quem imediatamente atrai o olhar. Isso deve-se predominantemente à extensão vermelha e brilhante do planejamento ondulante que serpenteia em torno de seu corpo e esvoaça para a esquerda, soprado pelo vento; é a cor mais forte do afresco.

A figura parece livre e descontraída. Em particular, a figura central de Galatéia é impressionante por seu sentido de vitalidade e harmonia. Boa parte disso resulta do fato de que, embora a parte inferior do corpo e a cabeça da ninfa se voltem para a esquerda, a parte superior do corpo e os braços estão voltados para a direita, de modo que o movimento é equilibrado pelo contramovimento.

Outros recursos utilizados são os três cupidos esvoaçando no céu, formando um semicírculo e apontando suas flechas de amor para Galatéia; as hastes das flechas ajudam a dirigir a direção do espectador para a ninfa. Os cupidos voadores à esquerda e à direita são mostrados em posição invertida (vistos de frente e por trás), o cupido no topo é equilibrado, talvez menos obviamente, pelo cupido que aflora à superfície da água, abaixo do carro de Galatéia.

Apreender e reconhecer os meios criados pelos artistas para obter determinados efeitos ajuda-nos a compreender um pouco melhor porque certas pinturas nos impressionam desta ou daquela maneira. Nossa apreciação de obras de arte pode ser frequentemente enriquecida por análises formais, o que nos permite descobrir o quanto de esmero e de pensamento sutil os pintores têm de empregar a fim de criar o que parecem ser pinturas perfeitamente naturais.
*

BOCCACCIO, DANTE E  PETRARCA - A MAIS EXPRESSIVA LITERATURA ITALIANA DO SÉCULO XIV

FRAGMENTO
Giovanni Boccaccio (Florença ou Certaldo, 1313-1375), Decameron

Adunque, acciò che in parte per me s’ammendi il peccato della fortuna, la quale dove meno era di forza, sì come noi nelle dilicate donne veggiamo, quivi più avara fu di sostegno, in soccorso e rifugio di quelle che amano, per ciò che all'altre è assai l’ago e ’1 fuso e l’arcolaio, intendo di raccontare cento novelle, o favole o parabole o istorie che dire le vogliamo, raccontate in diece giorni da una onesta brigata di sette donne e di tre giovani nel pistelenzioso tempo della passata mortalità fatta, e alcune canzonette dalle predette donne cantate al lor diletto. 


TRADUÇÃO
Torrieri Guimarães, Ed. Hemus, 1970

Assim sendo, para que se corrija, para mim, o pecado da Sorte, pretendo narrar cem novelas, ou fábulas, ou parábolas, ou estórias, sejam lá o que forem. A Sorte mostrou-se menos propícia, como vemos, para as frágeis mulheres, e mais avara lhes foi de amparo. Em socorro e refúgio das que amam, é que escrevo (pois, para as demais, são suficientes a agulha, o fuso e a roca). O que escrevo são as coisas contadas, durante dez dias, por um honrado grupo de sete mulheres e três moços, na época em que a peste causava mortandade. Ajuntam-se algumas cantigas das mulheres já mencionadas, cantadas à sua vontade.
*

NEL MEZZO DEL CAMMIN
Fragmentos d'A Divina Comédia, Dante Alighieri (Florença, 1265-1321)

INFERNO
Dal CANTO I


Nel mezzo del cammin di nostra vita
mi ritrovai per una selva oscura
ché la diritta via era smarrita. 


Ah quanto a dir qual era è cosa dura
esta selva selvaggia e aspra e forte
che nel pensier rinova la paura!


Tant'è amara che poco è più morte;
ma per trattar del ben ch'i' vi trovai,
dirò de l'altre cose ch'i' v'ho scorte.


Io non so ben ridir com'i' v'intrai,
tant'era pien di sonno a quel punto
che la verace via abbandonai.


Ma poi ch'i' fui al piè d'un colle giunto,
là dove terminava quella valle
che m'avea di paura il cor compunto,


guardai in alto, e vidi le sue spalle
vestite già de' raggi del pianeta
che mena dritto altrui per ogne calle.


Allor fu la paura un poco queta
che nel lago del cor m'era durata
la notte ch'i' passai con tanta pieta.


E come quei che con lena affannata
uscito fuor del pelago a la riva
si volge a l'acqua perigliosa e guata,


così l'animo mio, ch'ancor fuggiva,
si volse a retro a rimirar lo passo
che non lasciò già mai persona viva.


[...]


INFERNO
CANTO I (trecho inicial); Tradução de Augusto de Campos, In: CAMPOS, Augusto de. Invenção - de Arnaut e Raimbaut a Dante e Cavalcanti. São Paulo: Editora Arx, 2003.

No meio do caminho desta vida
me vi perdido numa selva escura,
solitário, sem sol e sem saída.

Ah, como armar no ar uma figura
desta selva selvagem, dura, forte,
que, só de eu a pensar, me desfigura?

É quase tão amargo como a morte;
mas para expor o bem que encontrei,
outros dados darei da minha sorte.

Não me recordo ao certo como entrei,
tomado de uma sonolência estranha,
quando a vera vereda abandonei.

Sei que cheguei ao pé de uma montanha,
lá onde aquele vale se extinguia,
que me deixara em solidão tamanha,

e vi que o ombro do monte aparecia
vestido já dos raios do planeta
que a toda gente pela estrada guia.

Então a angústia se calou, secreta,
lá no lago do peito onde imergira
a noite que tomou minha alma inquieta;

e como náufrago, depois que aspira
o ar, abraçado à areia, redivivo,
vira-se ao mar e longamente mira,

o meu ânimo, ainda fugitivo,
voltou a contemplar aquele espaço
que nunca ultrapassou um homem vivo.

[...]


[TANTO GENTILE E TANTO ONESTA PARE]

Tanto gentile e tanto onesta pare
la donna mia, quand'ella altrui saluta,
ch'ogne lingua deven tremando muta,
e gli occhi no l'ardiscon di guardare.

Ella si va, sentendosi laudare,
benignamente e d'umiltà vestuta;
e par che sia una cosa venuta
dal cielo in terra a miracol mostrare.

Mostrasi sì piacente a chi la mira,
che dà per li occhi una dolcezza al core,
che 'ntender nolla può chi nolla prova.

E par che de la sua labbia si mova
un spirito soave pien d'amore,
che va dicendo a l'anima: Sospira.


[É TÃO GENTIL E TÃO HONESTO O AR]
Tradução de Augusto de Campos, op.cit.

É tão gentil e tão honesto o ar
de minha Dama, quando alguém saúda,
que toda boca vai ficando muda
e os olhos não se afoitam de a fitar.

Ela assim vai sentindo-se louvar
na piedosa humildade em que se escuda,
qual fosse um anjo que dos céus se muda
para uma prova dos milagres dar.

Tão afável se mostra a quem a mira
que o olhar infunde ao coração dulçores
que só não sente quem jamais olhou-a.

E quando fala, dos seus lábios voa
Uma aura suave, trescalando amores,
que dentro d'alma vai dizer: "Suspira!"


[VEDE PERFETTAMENTE ONNE SALUTE]

Vede perfettamente onne salute
chi la mia donna tra le donne vede;
quelle che vanno con lei son tenute
di bella grazia a Dio render merzede.

E sua bieltate è di tanta vertute,
che nulla invidia a l'altre ne procede,
anzi le face andar seco vestute
di gentilezza, d'amore e di fede.

La vista sua fa onne cosa umile;
e non fa sola sé parer piacente,
ma ciascuna per lei riceve onore.

Ed è ne li atti suoi tanto gentile,
che nessun la si può recare a mente,
che non sospiri in dolcezza d'amore.


[VÊ-SE DENTRO DO CÉU PRODIGAMENTE]
Tradução de Henriqueta Lisboa. In:  In MARQUES, FARIAS, Reinaldo e Maria Eneida Victor (org.). Poesia Traduzida. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001.

Vê-se dentro do céu prodigamente
quem minha amada entre outras damas veja.
E toda aquela que a seu lado esteja
rende graças a Deus por ser clemente.

Tanta virtude tem sua beleza
que inveja acaso às outras não consente,
por isso as tem vestida simplesmente
de confiança, de amor, de gentileza.

Tudo se faz humilde em torno dela;
por ser sua visão assim tão bela
às que a cercam também chega o louvor.

Pela atitude mostra-se tão mansa
que ninguém pode tê-la na lembrança
que não suspire, no íntimo, de amor.
*

SONETO XXII
Francesco Petrarca (Arezzo, 1304-1374)

S' amor non è, che dunque è quel ch' io sento?
Ma s'egli è amor, per Dio, che cosa e quale?
Se buona, ond è effetto aspro mortale?
Se ria, ond' è si dolce ogni tormento?

S'a mia voglia arado, ond' è 'I pianto e 'I lamento?
S'a mal mio grado, il lamentar che vale?
O viva morte, o dilettoso male,
Come puoi tanto in me s'io nol consento?

E s'io 'I consento, a gran torto mi doglio.
Fra sì contrari venti, in frale barca
Mi trivo in alto mar, senza governo,

Sí lieve di saber, d'error sí carca,
Ch' i i' medesmo non so quel ch' io mi voglio,
E tremo a mèzza state, ardemdo il verno

                                                       
SONETO XXII
Tradução de Jamil Almansur Haddad, In: PETRARCA, Francesco. Cancioneiro, RJ: Editora Ediouro, 1995.

Se amor não é qual é este sentimento?
Mas se é amor, por Deus, que cousa é a tal?
Se boa por que tem ação mortal?
Se má por que é tão doce o seu tormento?

Se eu ardo por querer por que o lamento?
Se sem querer o lamentar que val?
Ó viva morte, ó deleitoso mal,
Tanto podes sem meu consentimento.

E se eu consito sem razão pranteio.
A tão contrário vento em frágil barca,
Eu vou para o alto mar e sem governo.

É tão grave de error¹, de ciência é parca
Que eu mesmo não sei bem o que eu anseio
E tremo em pleno estio e ardo no inverno.

¹ N. T.: Alude à barca

§ O Cancioneiro de Petrarca, completo e no original italiano pode ser lido aqui.
*

METATRADUÇÕES

Peter Paul Rubens (flamengo, 1577-1640), Vênus e Adonis, c. 1635. Óleo sobre tela, 95,5 x 77,5 cm.

A HISTÓRIA DE VÊNUS E ADONIS
Ovídio, Metamorfoses, livro décimo; tradução/ transcriação Nina Rizzi

Eu, Vênus, te lanço um olhar de súplica, Adonis, para que fique comigo.
Nua, te seguro o braço, em causa deste pequeno cupido que me flecha em mãos a perna.
Mas Adonis, você é a verdadeira encarnação de uma estátua grega, revela-se insensível ao meu apelo amoroso, e isso lhe será fatal, pois será morto por um javali.
Porém, deste nosso encontro trágico, o que prevalece é o amor.
É bonito, idílico.
*

ECO
Fidenzio Glottogrisio [(Camillo Scroffa) Vicenza, 1526-1565)]

In cuor di donna quanto dura amore?

- (Ore)

Ed ella non mi amò quant'io l'amai?

- (Mai)

Or chi sei tu che sì ti lagni meco?

- (Eco).
*

ECO
Fidenzio Glottogrisio; tradução Nina Rizzi

Quanto dura o amor no coração de uma mulher?

- (Horas-mulher)

E ela não me amava o quanto eu a amava?

- (Nunca-amava)

E como sei que você, homem, reclama comigo?

- (Eco-o).
*

METAPOEMA
Ottavio Rinuccini (italiano, 1562-1621)

Zefiro torna, e di soavi accenti
l'aer fa grato e 'l pie discioglie a l'onde,
e mormorando tra le verdi fronde,
fa danzar al bel suon su 'l prato i fiori.

Inghirlandato il crin Fillide e Clori
note tempran d'amor care e gioconde;
e da monti e da valli ime e profonde
raddoppian l'armonia gli antri canori.

Sorge più vaga in ciel l'aurora, e 'l sole
sparge più luci d'or: più puro argento
fregia di Teti il bel ceruleo manto.

Sol io, per selve abbandonate e sole,
l'ardor di due begli occhi e 'l mio tormento,
come vuol mia ventura, hor piango hor canto.

O poema de Rinuccini é um metaplágio aos soneto de Petrarca Torna Zéfiro e o bom tempo traz de volta - n º 310 no Cancioneiro -, aparece no conjunto de Monteverdi em seu sexto livro de 1614; assim como alude às ninfas. Um poema prontinho para música, hm? e pra minha metatradução, ora dunque ;)

Zefiro torna e di soavi accenti, SV 251, madrigal para dois tenores com baixo contínuo (1632); com os tenores Jean-Paul Fouchécourt e Mark Padmore, conduzido por William Christie.

TORNA ZÉFIRO
Metatradução de Nina Rizzi

Torna, Zéfiro, com palavras gentis e acentos doces
O ar agradecido se derrete nas ondas,
Murmura entre a verde ramagem,
Faz sua dança ao som das flores na campina.

Phyllis e Chloris, com guirlandas no rosto
Soltam notas alegres e doces como o amor
E das montanhas e vales profundos
Me rodopia o eco sonoro e harmônico das cavernas.

Levanta-se nas incertezas do céu da aurora
O sol a espalhar luzes de ouro ou prata pura
Enquanto Thétis ostenta seu manto cerúleo.

E eu, vagando abandonado à floresta e ao sol
Ardo ao brilho de dois olhos belos, o meu tormento,
Assim como minha ventura, eu choro, eu canto.
*

NINA
Chico Buarque

Nina diz que tem a pele cor de neve
E dois olhos negros como o breu
Nina diz que, embora nova
Por amores já chorou que nem viúva
Mas acabou, esqueceu

Nina adora viajar, mas não se atreve
Num país distante como o meu
Nina diz que fez meu mapa
E no céu o meu destino rapta
O seu

Nina diz que se quiser eu posso ver na tela
A cidade, o bairro, a chaminé da casa dela
Posso imaginar por dentro a casa
A roupa que ela usa, as mechas, a tiara
Posso até adivinhar a cara que ela faz
Quando me escreve

Nina anseia por me conhecer em breve
Me levar para a noite de moscou
Sempre que esta valsa toca
Fecho os olhos, bebo alguma vodca
E vou...


NINA
S/R

Nina dice di avere la pelle color della neve
e due occhi neri come la pece
Nina dice che anche se è giovane
per amore ha già pianto, che nemmeno una vedova
ma ha smesso, ha dimenticato
Nina adora viaggiare ma non si arrischia per un paese
così lontano come il mio
Nina dice che ha fatto la mia carta del cielo
dove il mio destino rapisce il suo
Nina dice che se voglio posso vedere sullo schermo
la città, il quartiere, il camino di casa sua
Posso immaginare l'interno della casa
il vestito che porta, i capelli, il diadema
Posso perfino indovinare che faccia fa
quando mi scrive
Nina desidera conoscermi presto
portarmi nella notte di Mosca
Ognivolta che suona questo valzer
chiudo gli occhi, bevo un pò di vodka
e vado.
*


Fotografia de Mario Tursi (italiano, 1929-2008), Chico Buarque, Giuseppe Ungaretti e parte do perfil de Vinícius de Moraes, em Roma, no restaurante Al Moro,1969.

A POESIA DE GIUSEPPE UNGARETTI

ETERNO

Pego entre uma flor arrancada e outra dada
o inexprimível nada 

- Giuseppe Ungaretti; tradução de Nina Rizzi


VALLONCELLO DELL'ALBERO ISOLATO IL 27 agosto 1916

Di queste case
non è rimasto
che qualche
brandello di muro

Di tanti
che mi corrispondevano
non è rimasto
neppure tanto

Ma nel cuore
nessuna croce manca

È il mio cuore
il paese più straziato

San Martino del Carso


VALLONCELLO DELL'ALBERO ISOLATO IL 27 agosto 1916
Tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti

Destas casas
nada sobrou
senão alguns
pedaços de muro

De quantos
me foram próximos
nada sobrou
nem tanto

No coração porém
nenhuma cruz me falta

É o meu coração
a região mais destroçada


PRATO

Villa di Garda aprile 1918

La terra
s'è velata
di tenera
leggerezza

Come una sposa
novella
offre
allibita
alla sua creatura
il pudore
sorridente
di madre


CAMPO
Tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti

Villa di Garda, abril de 1918

A terra
se cobriu
de tenra
leveza

Como uma esposa
nova
oferece
atônita
ao filho
o pudor
sorridente
de mãe


INNO ALLA MORTE

Amore, mio giovine emblema,
Tornato a dorare la terra,
Diffuso entro il giorno rupestre,
É l'ultima volta che miro
(Appiè del botro, d'irruenti
Acque sontuoso, d'antri
Funesto) la scia di luce
Che pari alla tortora lamentosa
Sull'erba svagata si turba.

Amore, salute lucente,
Mi pesano gli anni venturi.

Abbandonata la mazza fedele,
Scivolerò nell'acqua buia
Senza rimpianto.

Morte, arido fiume...

Immemore sorella, morte,
L'uguale mi farai del sogno
Baciandomi.

Avrò il tuo passo,
Andrò senza lasciare impronta.

Mi darai il cuore immobile
D'un iddio, sarò innocente,
Non avrò più pensieri nè bontà.

Colla mente murata,
Cogli occhi caduti in oblio,

Farò da guida alla felicità. 

(1925)


HINO À MORTE
Tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti

Amor, meu emblema de jovem,
Que volta a dourar a terra,
Difuso no dia rupestre,
É a última vez que contemplo
(Ao pé deste barranco, de impetuosas
águas, suntuoso, funesto
De antros) o rastro de luz
Que, como a lastimosa rolinha
Inquieta, meandra no gramado.

Amor, salvação fulgurosa,
Pesam-me os anos do porvir.

Largado o bastão fiel,
Resvalarei para a água sombria
Sem um queixume.

Morte, árido rio ...

Imêmore irmã, morte,
Igual ao sonho me farás
Beijando-me.

Terei teu mesmo passo,
Irei sem deixar traço.

Tu me darás o coração indiferente
De um deus, serei inocente,
Sem pensamentos, nem cuidados.

Com a mente murada,
Com os olhos caídos em esquecimento,
Far-me-ei guia da felicidade.
*

2 comentários:

Ana Tapadas disse...

Tem um excelente blogue! Parabéns.

bj

Anônimo disse...

FERNANDO MONTEIRO escreveu:

Tem mais do que um "excelente blogue"... cá neste sítio.
Aqui, há uma PREOCUPAÇÃO CIVILIZADA,
e quem não entender isso,
não entenderá mais nada,
ou coisa nenhuma decifrará daquelas, delicadas, que vão morrendo, uma a uma,
como coisas tapadas.