ellenismos?


APRESENTAÇÃO


Transcender o espaço físico para o espaço sensorial; gozar nos espaços poéticos; gozar com todos os sentidos, poros-pêlos, num sentido muito mais amorável que sexual.

"Tornar visível o invisível: seria esta a verdadeira função de todas as linguagens?" (Carrière).

Assim é o ellenizar-se: justapor uma poesia a uma pintura e uma música e/ ou filme, propondo iluminar o mundo do espaço verbal por intermédio de espaços tal como foram definidos e explorados pelas artes visuais, sobretudo as artes plásticas. O instrumento verbal é tão cabalmente ambiental a ponto de escapar a todo estudo perceptivo em termos de seus valores plásticos. Todos são capazes de falar, contudo poucos são capazes de pintar. Um diálogo entre as formas e qualidades diferentes das artes irmãs - poesia, literatura, música e artes visuais - prescinde de argumentos a favor.

A vantagem de utilizar duas ou três artes, simultaneamente, é que a primeira permite uma viagem para dentro da aparência das coisas e a segunda uma jornada para fora da aparência das coisas. A continuidade do relacionamento e do diálogo das artes irmãs fornece um precioso meio para educar a percepção e a sensibilidade. A obra de arte é aberta, mas embora permita uma infinidade de leituras, é ela que, em última instância, dirige essa leitura. Na experiência da fruição estética, é necessário deixar a obra ser, presença única, realidade sensível carregada de significado espiritual e de valor artístico. 

No entanto, se ellenizar é justapor as artes, provocando com suas relações a percepção, sensibilidade e reflexão, e cada edição temos uma centro gerador específico, o tema do ellenismos sempre foi o leitor. Poesia, Prosa, Música e Artes Visuais são apenas linguagens. Mas os sentimentos experimentados nessas linguagens não existem enquanto tal, mas apenas em relação a um sujeito que os vivencia. É a leitura do outro, segundo seu olhar muito particular que o completa.


EU LEIO, TU LÊS, ELES LÊEM

Um rolo de filme que nunca foi projetado é apenas potencialmente arte. É como um livro que ninguém leu. Toda obra de arte é dirigida a alguém. O fruidor é que completa sua existência. Mas como ler cor, gestos, sons, formas?

Da mesma maneira que para ler livros precisamos decodificar as letras, sílabas, dominar a gramática, enfim ser alfabetizados nessa língua, o mesmo acontece com a arte. Quanto mais uma pessoa entra em contato com as formas artísticas, mais se aprofunda nessa linguagem, enriquece seu repertório, conhece autores/ artistas, tem acesso à compreensão da produção estética da Humanidade.

Ler é produzir sentido. Lemos a cor vermelha em uma obra figurativa ou abstrata, da mesma maneira que a cor vermelha do semáforo?

No trânsito, frente às cores do semáforo, a nossa leitura se prende a uma única possibilidade de interpretação. Nesse momento, lidamos com códigos fechados, que são signos utilitários, porque o humano lhes atribuiu um único significado para melhor organizar sua vida.

Diante do elemento cor na obra de arte, abre-se a possibilidade da multiplicidade de leituras. Nesse momento você, enquanto fruidor, aprecia uma composição estruturada por códigos abertos, cuja decodificação permite uma infinidade inesgotável de interpretações.

Quando você assiste a um filme ou ouve uma música, é impossível interpretá-los desvinculados da sua história de vida e do momento no qual você vive a experiência estética. Você vê a obra de acordo com a sua ótica ou de acordo com suas referências pessoais e culturais.

Ao apreciarmos obras de arte, nós as ressignificamos, as atualizamos, produzimos interpretantes, de acordo com nossa sensibilidade atual. Se as significações de produções artísticas mudam de pessoa para pessoa e até mesmo para a mesma pessoa, fica evidente que obras produzidas no passado provavelmente não tinham, na época, a mesma significação que a elas atribuímos hoje. É fato que existem certas formas arquetípicas que persistem através dos tempos; e outras cujo sentido - não o racional, mas o metafórico, o simbólico - ainda conseguimos intuir. Mas as platéias de mil ou duzentos anos atrás com certeza encontravam sentidos diferentes em determinadas alegorias, algumas talvez impenetráveis para nós, e nem por isso sem significação hoje.

A fruição é, portanto, individual. A emoção, a sensação e o pensar que ela provoca em nós são ressonâncias internas provocadas pelas sutilezas da própria linguagem. Quando estamos diante de uma obra de arte, a recriamos em nós. A contemplação de uma obra artística nunca é passiva, algo de nós penetra na obra ao mesmo tempo que somos por ela invadidos e despertados para novas sensibilidades.

A forma de nos relacionarmos com a obra de arte é totalmente diversa da relação cotidiana, utilitária que temos com os fatos, com as coisas, com o nosso dia-a-dia. Nossa percepção é outra, diferente daquela que questiona o porquê dos objetos ou a sua função: uma caneta serve para escrever, uma faca para cortar. A verdade na arte é outra, o "ser" do objeto artístico é outro. A arte inaugura um outro campo de sentidos e significações. A metáfora é que nos fala. Esse comunicar-se através de símbolos artísticos e a multiplicidade de seres humanos que contemplam uma mesma obra de arte é que fazem surgir um oceano de interpretações para cada música ouvida, filme assistido ou tela contemplada. E, quando relacionadas, ainda outras tantas.

Através da leitura de sua obra, é possível desvelar a necessária articulação de três campos conceituais: a criação/ produção, a percepção/ análise e o conhecimento da produção artístico-estética da humanidade, compreendendo-a conceitual, histórica e culturalmente.
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HISTÓRICO

O blogue ellenismos, existe desde julho de 2003. A princípio com o nome Super Verme (que era preciso muita coragem pra expor poemas - sempre relacionados à outros poemas e artes - mesmo que na rede); coragem que partiu da força poética  da amizade de duas das pessoas mais importantes pra mim: Líria Porto e Roberta Silva. Escrevíamos freneticamente à guisa de nossos próprios olhares. De doismiliquatro a doismilisete as postagens eram mais rareadas, devido aos muitos trabalhos na universidade e a falta de um computador pessoal. Neste período, o blogspot sequer aceitava a inclusão de imagens nas postagens e o YouTube nem existia, ainda que o blogue desde o início sugerisse um painel artístico, como uma teia de relações sem fim; fazia os painéis de imagens e músicas e filmes sempre direcionando os leitores a outras páginas, onde poderiam verouvir as relações que fazia com textos meus e de outros autores, clássicos ou não. No início de 2007 vim para a terra que afetivamente escolhi para abrigar os pés, o Nordeste, especificamente Forteleza/CE, onde mais uma vez constatei: é possível ser anjo na terra: Ana Beatriz, Viegas junto das indefectíveis Líria Porto, Roberta Silva, Mariza Lourenço e Silvana Guimarães, me deram o arrimo necessário (intelectual, artístico, afetivo) para estar por aqui.

Em 2008, o blogue se desmembrou em dois: Super Verme resistia na trincheira política e o ellenismos na arte (inclusive política, pois que toda ação é política). De julho de doismilioito pra cá,  o blogue passou a ser diário - ou quase - e ter malomêno esse formato: a exposição de uma obra visual seguida de breve análise, relacionando-a à textos em prosa e verso, mais músicas e filmes. Crescemos muito, em visitas e em qualidade. Um blogue que nunca pretendeu nada além de levar o Belo e o Sublime aos nossos leitores, num sentido kantiano: o que faz bem à essência e aos olhos.

E agora, chegamos ao auspicioso 2012. Ano que marca o início do nosso mundo ellenista como Revista de Literatura, Arte e Debates.

Obrigada a todos leitores, poetas, artistas e amigos que dia-a-dia nos ajudam a melhorar, com críticas, sugestões, elogios ou mesmo raras visitas de que nem ficamos a saber. Gente que ainda acredita na arte não só pela importância estética, mas também por sua ação transformadora da realidade - individual e coletiva -, às vezes tão dorida. Sem vocês nada disso era possível, não mesmo, afinal o que é o ellenizar senão fundir tudo numa imensa e única teia? ellenismos, somos nós, irmandados pela ação e amor à arte enquanto estética, reflexão e transformação. Seja bem-vind@!

Nina Rizzi

3 comentários:

Anônimo disse...

ah, adoro a ninna ;expresssões atraves de palavras!

Regiane de Paiva disse...

Estou tendo o prazer de conhecê-la graças ao nosso primeiro contato antes da VII-Feira do Livro de Mossoró- RN. Blog maravilhoso... o nome não poderia ter sido mais prazeroso!
Abraços Nina!
Regiane de Paiva.

Adrianna Coelho disse...


outro lugar, desses raros lugares,
em que a arte...
a arte...
só a arte!